Olha se não me avisavam!
Desenho de Danielle-Mae Duran (Beijinho) |
O Jaquim, da
minha terra, andava tristonho…
Confessou a um
vizinho que lhe tinham dito que a Esperança era a Última a morrer:
- Ando mesmo
triste Manel…
- Porquê,
Jaquim? – perguntou o Manel.
- Porque a minha
Sogra se chama Esperança… Vê lá tu a desdita!
- Ó Jaquim. Não
é nada disso. Olha que a última a morrer é a ideia…
A luz voltou a
brilhar no olhar curvo do Jaquim.
Isto me
confessou ele próprio, quando me procurou para receber cuidados a uma ferida
para implante de um pacemaker.
- Senhor
enfermeiro, senti-me mal, fui para o Hospital da Cidade Grande, os Doutores
botaram-me uma pilha no coração, dizem que isto tem validade para mais de 20
anos. Tenho 92… Veja lá o que eles foram fazer!
Ri, com ele, e
talvez ele de mim e eu de mim próprio. Mas aprecio uma boa gargalhada.
Tratei a ferida.
Reagendei o momento e ia despedir-me cordialmente, com um aperto de mão. (Que
estranho, já foi no tempo em que se apertava as mãos às pessoas). Mas o Jaquim,
sacou de um migalho de papel que trazia dobrado no bolso, desdobrou-o com
delicadeza, pendurou as cangalhas na ponta do nariz e, seguindo com o dedo como
se quisesse ensinar-me a ler, prosseguiu:
- Eles deram-me
estas instruções. Diz aqui para não fazer isto, não fazer aquilo… E sabe, aqui
mais abaixo, - apontou - diz para eu não
ter relações sexuais durante um mês! Já viu Senhor enfermeiro. Olhe se eles não
me avisavam! A tragédia que podia acontecer… - E repetiu. – Olhe se eles não me
avisavam…